Dom Gilvan Francisco dos Santos, O.S.B
(Monge Beneditino)
Salvador, Bahia – 10 de fevereiro de 2018
INTRODUÇÃO
Hoje, a Santa virgem Escolástica, qual uma pomba, subiu jubilosa aos céus; hoje, com seu irmão, goza para sempre as alegrias da vida celeste. (Liturgia das Horas-Rito Monástico).
A virgem prudente entrou para as bodas e vive com Cristo na glória celeste. Como o sol, ela brilha entre os coros das virgens (Liturgia das Horas).
Temos na Santa Igreja, alguns santos que estão intimamente ligados a outros santos. Por isso, ao escrevermos ou falarmos espontaneamente de suas vidas, somos quase que obrigados a falar também das figuras que os acompanharam na sua caminhada cristã ou por serem ligados por laços biológicos como no caso de São Bento e Santa Escolástica, São Cirilo (826-869) e São Metódio (815-885), São Cosme e São Damião, etc. Há Também aqueles que foram unidos pelos mesmos ideais de vida consagrada a Deus no seguimento de Cristo num laço puramente espiritual como: São Francisco de Assis (1181-1226) e Santa Clara de Assis (1194-1253), Santa Teresa d’Ávila (1515-1582) e São João da Cruz (1542-1591), São Francisco de Sales (1567-1622) e Santa Joana Francisca de Chantal (1572-1641), e tantos outros.
Aqui deixo aos meus leitores um pouco da vida da grande Abadessa Santa Escolástica e do nosso grande Patriarca São Bento, pois seria impossível falar de Santa Escolástica e não citar irmão São Bento. Eles sempre estiveram unidos desde o ventre materno pois eram irmãos gêmeos e até unidos no túmulo. Pois, morrendo Santa Escolástica, no dia 10 de fevereiro do ano de 547, São Bento pede aos monges que busque o corpo da irmã e a enterra em seu próprio túmulo no Mosteiro de Montecassino. Morrendo também ele 40 dias depois em 21 de março. O primeiro e grande Papa Beneditino São Gregório Magno (540-604), escreveu em seus Diálogos estas belas palavras referentes a São Bento e sua Santa irmã Escolástica: “Desse modo, aconteceu que aqueles cujo espírito sempre fora um só em Deus, também os corpos não foram separados pela sepultura” (Gregório Magno- Diálogos, cap. 34).
Santa Escolástica e nosso Pai São Bento estão no céu na presença de Deus, de Jesus Cristo, da sua Santíssima Mãe a Virgem Maria, dos Anjos e dos Santos todos, intercedendo por seus filhos monges e monjas e por todos aqueles que invocam a sua poderosa intercessão.
Boa leitura!
DADOS BIOGRÁFICOS:
- Nascimento: No ano de 480 d.C., em Nórcia, Úmbria - Itália.
- Pais: Anicius Eupropius e Cláudia Abondantia Reguardati.
- Irmão: São Bento de Núrsia, Abade.
- Falecimento: Em 10 de fevereiro de 547 d.C., Montecassino, Cassino, Itália.
- Padroeira: Das crianças com convulsões; das monjas; e invocada contra chuvas e tempestades.
BIOGRAFIA DE SANTA ESCOLÁSTICA
ABADESSA
Duas crianças unidas no ventre materno, unidas na vida, unidas no túmulo, e unidas no céu. Assim, dou início a vida de Santa Escolástica. O Nosso Santo Patriarca São Bento. Nasceu na cidade de Nórcia, província de Perugia, na Itália, no ano de 480 e tinha uma irmã gêmea chamada Escolástica; a grande Abadessa Santa Escolástica (480-547), que foi a primeira monja beneditina. Fundadora do ramo feminino da Ordem de São Bento. Eles pertenciam à influente e nobre família Anícia. Segundo a tradição seus pais chamavam-se Anicius Eupropius e Cláudia Abondantia Reguardati. A mãe veio a falecer no parto ficando o seu pai em grande sofrimento pela perda da esposa. No entanto, não faltou às crianças esmerada e sólida educação, principalmente na fé cristã. Tal foi a educação cristã que Santa Escolástica fez a sua consagração a Deus vivendo em castidade perfeita ainda muito jovem muito antes do seu irmão Bento.
Certamente, Santa Escolástica possuía desde a sua infância um espírito elevado a Deus, uma vida de espiritualidade e penitência bastante séria, pois neste período do início do Monaquismo cristão no Ocidente, as pessoas que se entregavam a Deus, levavam uma vida de grande seriedade na oração e na penitência.
Santa Escolástica amava tanto seu irmão Bento, que quando este sai da casa paterna para estudar retórica em Roma, ela o segue. Certamente, ela consagrou sua vida a Deus antes mesmo do seu irmão Bento. Pelos poucos relatos que possuímos de sua santa vida, podemos perceber que ela sempre foi ligada ao irmão pelo ideal de consagração a Deus. O ideal de consagração que Santa Escolástica desejava possuir, creio que ela desejava algo bem mais relacionado a uma vida de entrega com uma organização bem mais estruturada. Por isso, a vemos seguir o seu irmão São Bento na vivência de sua Santa Regra para os Mosteiros. Assim, Santa Escolástica foi a primeira Abadessa das monjas beneditinas (ramo feminino da Ordem de São Bento) por seguir o ideal monástico de seu querido irmão o Patriarca São Bento.
A Regra que São Bento escreveu era tudo aquilo que Santa Escolástica desejava seguir. Ela ficou fascinada com a forma de vida escrita por Bento. Esta era uma verdadeira inspiração do Espírito Santo para o seguimento de Jesus Cristo, pois a Regra Beneditina é, toda ela, um escrito Cristológico. Com isso, Santa Escolástica deixa tudo e decide viver num Mosteiro com um pequeno grupo de moças que a acompanha no seu ideal de vida monástica. Aí ingressam muitas outras jovens fascinadas pelo ideal do seguimento do Cristo; dirigidas estimuladas por Santa Escolástica a viverem a sua consagração total ao Deus todo-poderoso, na ORAÇÃO, no TRABALHO (Ora et Labora), no ESTUDO e na VIDA EM COMUNIDADE, ajudando, e suportando umas às outras com caridade e amor fraternal. Daí em diante, cresce e, se desenvolve, com a graça de Deus, o ramo monástico cenobítico beneditino feminino. O Mosteiro do qual Santa Escolástica era Abadessa, foi o Mosteiro de Primarola, que ficava a poucos quilômetros de distância de Montecassino onde residia o seu caro irmão Bento.
Para uma vivência monástica feminina, Santa Escolástica recebeu grande ajuda do irmão na organização da vida das monjas com as adaptações da Santa Regra que era dirigida para os Mosteiros dos monges. Como já sabemos o sexo feminino tem suas singularidades bem como o sexo masculino. Portanto, eram necessárias certas mudanças em alguns pontos da Regra, principalmente neste século VI em que o Ocidente se encontrava em grande caos por ocasiões das guerras etc; Era necessário um certo rigor nas normas estabelecidas para aqueles que procuravam a vida de perfeição no seguimento de Jesus Cristo no Mosteiro. Por causa disso vemos na Regra Beneditina o bloco que trata das penas, às vezes, muito severas para os monges que incorriam em faltas na observância monástica. Estas normas estão redigidas nos capítulos 23º ao 30º, nestes, está todo o código penal da Regra Beneditina. Portanto, a necessidade de adaptações para as monjas que sem dúvidas eram mais frágeis que os monges.
Outrora, a nossa Ordem Beneditina era dirigida apenas pela Regra de nosso Pai São Bento; Porém, nos dias atuais somos dirigidos pela Santa Regra e pelas Constituições da Congregação Beneditina Brasileira. (confira a lista das várias Congregações da nossa Sagrada Ordem Beneditina, no link: Os-Reverendissimos-Abades-Primazes-da-Confederação-da-Ordem-de-São-Bento.). Estas Constituições são direcionadas aos monges e outra direcionadas às monjas (Constituições das monjas), cada uma com suas peculiaridades. É claro que, ambas são fundamentadas principalmente, na vida em comunidade e no princípio ORA ET LABORA (Oração e Trabalho) criado por nosso Patriarca São Bento.
Santa Escolástica apesar de se encontrar com seu irmão Bento apenas uma vez por ano, devido às regras dos Mosteiros, eles sempre foram muito ligados um ao outro não só pelos laços sanguíneo mais principalmente na vida de espiritualidade. Ouçamos com atenção o grande Papa São Gregório Magno (540-604) onde nos deixou em seus Diálogos dois capítulos referentes a essa união de São Bento e Santa Escolástica ao relatar o milagre da Santa e a sua santa morte. Assim nos diz São Gregório:
A sua irmã que se chamava Escolástica, consagrada desde a infância a Deus onipotente, costumava visitá-lo uma vez por ano. O homem de Deus descia para vê-la numa casa pertencente ao mosteiro, não muito distante do mesmo. Como de costume ela chegou e, na companhia de alguns discípulos, o seu venerável irmão foi encontrá-la. Passaram o dia inteiro louvando ao Senhor, em santos colóquios e, quando já estava anoitecendo, comeram juntos. Sentados à mesa, conversaram acerca de de temas sagrados, até que se fez bastante tarde. Foi então que a sua devota irmã implorou-lhe que ficasse, dizendo: “Peço-te que esta noite não te vás, para podermos falar das alegrias da vida celeste até ao amanhecer”. Ele respondeu: “O que dizes, irmã? Não posso absolutamente pernoitar fora do mosteiro”. Naquele momento o céu estava sereno e não se via nem mesmo uma nuvem. Ao escutar a recusa do irmão, Escolástica cruzou as mãos sobre a mesa e nela pousou a cabeça para rezar a Deus todo-poderoso. Assim que levantou a cabeça, irromperam relâmpagos e trovões, acontecendo um tal dilúvio que nem o venerável Bento, nem os monges que estavam com ele puderam colocar os pés fora da porta. A santa monja, reclinando a cabeça sobre as mãos, havia derramado na mesa um rio de lágrimas, com as quais transformara em chuva o azul do céu. Entre a oração e o temporal não se passou sequer um instante, pois de tal modo foram simultâneas a oração e a chuva que enquanto ela erguia a cabeça já ressoavam os primeiros trovões. A elevação da cabeça e a precipitação da chuva ocorreram num só e único momento. O homem de Deus, vendo que não podia retornar ao mosteiro em meio a todos aqueles relâmpagos e trovões e àquela espantosa tempestade, pôs-se a lamentar, dizendo: “Que Deus onipotente te perdoe, irmã! O que fizeste?” E ela respondeu: “Eu te pedi e não me quiseste escutar. Pedi ao meu Senhor e ele me atendeu. Agora sai, se puderes, deixa-me e retorna ao mosteiro”. Impossibilitado de sair, Bento foi obrigado a permanecer ali, contrariado, onde não havia desejado ficar por sua espontânea vontade. Assim, passaram toda a noite em vigília e saciaram-se com santas conversas, comungando suas experiências de vida espiritual (Diálogos, cap. 33).
Em seguida, prossegue São Gregório Magno com outro belo relato da sobre a Santa, agora referente a sua santa morte, a qual foi vista a certa distância por São Bento que se encontrava no Mosteiro de Montecassino em sua cela. Este fato ocorreu três dias após aquele belo encontro dos dois irmãos. Ouçamos São Gregório:
No dia seguinte, Escolástica e Bento retornaram aos seus respectivos mosteiros. Três dias depois, o homem de Deus estava em sua cela quando, ao erguer os olhos ao céu, viu a alma da irmã, saída do corpo, penetrar nas profundezas do céu, sobre a forma de pomba. Repleto de alegria pelo grande triunfo da irmã, agradeceu a Deus todo-poderoso com hinos de louvor e deu a notícia a seus monges, ou melhor, ordenou a alguns deles que pegassem o corpo de Escolástica e o transportassem ao mosteiro, para que fosse enterrado na sepultura que ele havia preparado para si (Diálogos, cap. 34).
Vejamos a beleza nesta frase de São Gregório: “viu a alma da irmã, saída do corpo, penetrar nas profundezas do céu, sobre a forma de pomba. É por causa desse relato de São Gregório que Santa Escolástica Normalmente é representada com uma pomba. Também existem outras representações tanto na arte escultórica (escultura) como na pictórica (pintura), da Santa, várias outras representações como o báculo pastoral abacial, o livro da Regra ou o Evangelho, o menino Jesus, chuva, raios, etc.
De grande beleza é o término deste capítulo quando São Gregório diz: “Desse modo, aconteceu que aqueles cujo espírito sempre fora um só em Deus, também os corpos não foram separados pela sepultura” (Diálogos, cap. 34).
Todos os fatos relatados por São Gregório Magno da vida de São Bento e Santa Escolástica foram coletados anos mais tarde pelos seus discípulos que foram testemunhas oculares dos fatos narrados em seus Diálogos. Nos diz São Gregório:
Não conheço todos os episódios da vida e o pouco que estou para narrar, aprendi-o com os seus quatro discípulos: Constantino, homem digno de grande veneração, que o sucedeu no governo do Mosteiro; Valentiniano, que por muitos anos foi o superior do Mosteiro de Latrão; Simplício, que foi o terceiro a governar a sua comunidade e, por fim, Honorato, que ainda hoje dirige o Mosteiro em que Bento viveu no início de sua vida monástica (Diálogos, Prólogo).
O Abade Constantino foi o primeiro sucessor de São Bento em Montecassino bem como o Abade Simplício o segundo sucessor de São Bento em Montecassino. Era sacerdote. A ele se deve a 1ª edição da Santa Regra.
Quarenta dias após a morte da sua cara irmã Santa Escolástica, também subia ao céu o Servo de Deus, nosso grande Patriarca São Bento, no dia 21 de março do ano de 547, no Mosteiro de Montecassino que fundara no ano de 529 e onde escreveu a Santa Regra para os monges e monjas, na região de Cassino, Itália.
Hoje, podemos ver claramente, que a mensagem e o grande legado que nos deixaram as santas de vidas de nosso Pai São Bento e da grande Santa Escolástica, legado este, que impulsionou todo o Ocidente cristão, formando a civilização de toda a Europa cristã. Por este motivo, São Bento foi declarado o Patrono principal de toda a Europa pelo Sumo Pontífice Beato Paulo VI no ano de 1964.
Portanto, invoquemos sempre Santa Escolástica e, seu irmão, nosso Patriarca São Bento. Peçamos a eles que interceda por todos nós junto a Deus e sua Santíssima Mãe a Virgem Maria, dos santos monges e monjas e de todos os Anjos. Assim, não seremos jamais confundidos.
ORAÇÕES A SANTA ESCOLÁSTICA
ORAÇÃO
Celebrando a festa de Santa Escolástica, nós vos pedimos, ó Deus, a graça de imitá-la, servindo-vos com caridade perfeita e alegrando-nos com os sinais do vosso amor. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém. (Liturgia das horas).
ORAÇÃO
Ó Deus, que de modo admirável ornastes Santa Escolástica com a luz da inocência, dai-nos sempre agradar-vos pela pureza da vida, a fim de vos louvarmos com o coro das virgens na alegria do céu. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. (Missal).
REFERÊNCIAS
GREGÓRIO MAGNO, São. São Bento: Vida e Milagres / São Gregório Magno; Dom Gregório Paixão, OSB. Salvador: Edições São Bento, 2002.
Ut In Omnibus Glorificetur Deus (RB 57, 9)
Comments